A Estrada Real é rica em tradição artística, que se manifesta em diversas formas, como a pintura, a escultura, a música e a dança. Dentre essas manifestações, a cerâmica ocupa um lugar especial, sendo uma das mais antigas e populares formas de arte.
As primeiras evidências da produção de cerâmica em Minas Gerais datam de cerca de 6.000 anos atrás, durante o período pré-colonial. Nessa época, os povos indígenas usavam a cerâmica para a fabricação de objetos utilitários, como potes, as e vasos, bem como para a produção de objetos ritualísticos e decorativos.
Com a chegada dos portugueses, a produção de cerâmica sofreu uma grande influência europeia, trazendo novas técnicas e estilos de cerâmica, que foram incorporados pelos artesãos locais.
No século XVIII, a produção de cerâmica atingiu seu auge, durante o período do ciclo do ouro. Nessa época, os objetos de cerâmica eram usados para armazenar e transportar alimentos e bebidas. Após o declínio do ciclo do ouro, a produção de cerâmica continuou, mas em menor escala. No entanto, a arte da cerâmica nunca deixou de ser praticada, e continua a ser uma importante manifestação cultural.
A cerâmica, tanto de uso comum como artístico, é produzida hoje por toda parte, seja em grandes estabelecimentos, ou por pequenos artesãos, e citamos alguns dos principais centros de produção de cerâmica pela Estrada Real.
Brumadinho/Serra da Moeda
A produção ceramista na região de Brumadinho foi promovida por tribos indígenas e quilombos e a décadas essa tradição faz da região uma das mais renomadas produtoras de peças em cerâmica.
No início da década de 70, a influência ceramista na cidade foi da artista japonesa Toshiko Ishii, que realizou um mapa sobre cerâmica no estado mineiro e inspirou diversos artistas, que buscavam por seus conhecimentos e construíram os primeiros ateliês na região. Entre eles, Erli Fantini, Inês Antonini e Adel Souki.
Hoje, Brumadinho, Piedade do Paraopeba e Encosta da Serra da Moeda abrigam ateliês de artistas consagrados nacional e internacionalmente, pelas diversas características de criação, originalidade e manipulação da argila.
As cerâmicas autorais são únicas, justamente por serem criadas a partir da percepção de cada artista e visitar estes ateliês leva o turista a uma experiência imersiva, com um contato direto com o ceramista, em que se tem a oportunidade de esculpir a sua própria peça e criar uma memória afetiva sobre o item.

Uma dessas experiências é de abertura dos fornos, acompanhando a retirada das peças in loco, além de poder conversar sobre a origem dos fornos e sobre as técnicas ceramistas antigas e atuais, entre elas a queima raku, feita a lenha.
Criado em 2023, nos meses de abril e setembro acontece o Circuito de Cerâmica de Brumadinho, onde ceramistas locais abrirão as portas de seus ateliês para o público.

Esta é uma rara oportunidade para conhecer o processo de produção da cerâmica, como são extraídos a argila e produzidos os esmaltes, as inspirações de cada um destes artistas… e claro, acompanhado do bom receber mineiro.
Ouro Branco e Conselheiro Lafaiete
Salvaguardada pelas duas cidades, a Cerâmica Saramenha é tombada como patrimônio imaterial por sua importância cultural para ambas as localidades.
A cerâmica Saramenha começou a ser produzida oficialmente no século XIX, na chácara Saramenha, a 3 Km de Ouro Preto. Seu traço mais marcante é o vitrificado, obtido à custa de óxido de ferro e pedra moída derretidos em as de ferro adaptadas aos rústicos fornos da época.

A técnica de produção da cerâmica, persiste até hoje nas duas cidades, graças ao esforço do Mestre Bitinho (1918-1998), como era conhecido Silvestre Guardiano Salgueiro. Mestre Bitinho aprendeu a fazer a cerâmica com seu pai, Antônio Guardiano Salgueiro, que, por sua vez, aprendeu com o avô, Pedro de Deus Salgueiro.
Rosemir Hermenegidio, de Conselheiro Lafaiete foi o primeiro discípulo do Mestre Bitinho e hoje preserva a técnica em seu ateliê, onde expõe e comercializa suas peças.
Em Ouro Branco, a técnica de produção da cerâmica foi reada pelo Mestre Bitinho, através de oficinas oferecidas pela prefeitura. Leonardo Ricart dos Santos Barros, aprendiz da época, mantem o legado na cidade produzindo suas peças e ministrando cursos, na oficina de Cerâmica Saramenha Mestre Bitinho, inaugurada em 2012.

As peças em Cerâmica Saramenha possuem suas peculiaridades, e podem ficar com cores diferenciadas, dependendo da cor da argila, da forma em que é finalizada rústica ou vitrificada. Usa-se a argila escura, comum na região, devido à presença de matéria orgânica e restos de carbono. Esses materiais são consumidos durante a primeira queima tornando clara a coloração da peça.
A esmaltação, também denominada de “banho” é feita com esmalte transparente. Há diversas nuances de cores e manchas.

Cunha/SP
Fazer a de barro é uma atividade transmitida por gerações, das técnicas seculares dos povos indígenas, mescladas com outras dos africanos e colonizadores europeus.

As eiras de Cunha são ceramistas tradicionais que estiveram ligadas ao Ciclo do Ouro no ado.
No século XVIII, Cunha era um importante ponto de parada no Vale do Paraíba de tropas vindas de Minas Gerais com destino ao Porto de Paraty. Nesse panorama, surgiram as eiras como a primeira manifestação cerâmica da localidade.
Em 2017 foi criado o coletivo artístico denominado Cerâmica Vargem do Tanque, comunidade rural de Cunha/SP, com intuito de resgatar a técnica ceramista primitiva, com modelagem manual e queima artesanal.
Cerâmicas de Cunha- Foto: Isabel Franke.
Desde então o Instituto Cultural da Cerâmica de Cunha vem formando jovens ceramistas para o ofício que tornou a cidade de Cunha uma referência na arte cerâmica e o maior polo existente na américa do sul com a técnica japonesa noborigama.
Hoje a cerâmica da Vargem do Tanque é referência no município, com peças artesanais, genuínas, que remetem às tradições da região.
Estrada Real: VIVA, EXPERIMENTE, DESCUBRA!
Daniel Magalhães Junqueira
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